A natureza política do julgamento de Jair Bolsonaro

O Supremo Tribunal Federal acolheu a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e instaurou ação penal contra ele e mais 33 acusados de tentarem dar um golpe de Estado. Daqui para frente, haverá um processo penal ao qual Bolsonaro terá que responder e, ao final, poderá ser condenado a mais de vinte anos de prisão.

O alvo desta minha análise não é discutir os aspectos legais da ação – isso vem sendo feito em centenas de artigos disponíveis na Internet. Minha pretensão é abordar a questão política que está por trás de todos esses fatos.

Sem dúvida alguma, há questões legais do ponto de vista penal, mas há também o componente político desse julgamento. Eu diria que o fator político será mais determinante para levar Bolsonaro à prisão do que a própria infração penal.

Assim como Dilma, em 2015, foi afastada por um processo de impeachment calibrado cirurgicamente para extirpar o domínio petista no poder – sem o qual corria-se o risco de termos o PT governando por muitos e muitos anos –, agora também há um movimento estratégico para afastar Bolsonaro e seus aliados.

Faça o que fizer, defenda-se como puder, apresente as provas que apresentar, Bolsonaro será condenado. Assim como aconteceu com as pedaladas fiscais de Dilma, não havia crime algum ali, mas isso era a parte que menos interessava.

Todos sabemos que, no golpe contra Dilma, o terreno foi preparado para que o PSDB chegasse ao poder. Aí veio a Lava Jato, a antipolítica, o mar de lama, e o cenário acabou oferecendo, de presente, a cadeira presidencial a um deputado do baixo clero, que conseguiu se associar a um discurso religioso oportunista e a valores morais tradicionais que atendiam às circunstâncias e anseios populares.

Bolsonaro rapidamente mostrou o que era em essência: despreparado e com tendências antidemocráticas. Seguindo um roteiro semelhante ao que afastou Dilma e o PT do poder, abriu-se um caminho para também retirar Bolsonaro de cena.

A diferença é que, no caso de Bolsonaro, ele mesmo forneceu aos seus inimigos a munição que o fulminaria. Suas condutas reprováveis e as provas que ele próprio produziu contra si são suficientes para o enredo. Os fatos nem precisaram ser forjados, como ocorreu no impeachment de Dilma, porque, gratuitamente, Bolsonaro teceu as redes nas quais acabaria enroscado.

O julgamento atual é o desdobramento de um roteiro já escrito – um roteiro que já foi usado antes e que será usado novamente sempre que houver ameaças visíveis. Ameaças a quê? A quem? Ao establishment.

Concluindo: o julgamento de Bolsonaro tem essa natureza política. Além de julgar os crimes cometidos pelo ex-presidente, atende aos interesses de extirpar um mal. Nesse contexto, insere-se o STF. Não há mocinhos, apenas interesses.

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